23 de abril de 2009

Manicômio.

Mostra de Resultados - Julho 2009
Escola de Teatro PUC Minas

Conto - Manicômio
Por Bárbara

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Relato

Está frio. O cobertor não me aquece, sinto uma dor na espinha, e um calafrio no peito. (Pausa - Respiração forte). Escuto de longe apenas o eco da conversa no final do corredor. Aqui não consigo saber se é dia ou noite, a janela fica distante da cama e a cortina o tempo todo fechada. Sei que existe mais de 1585 azulejos brancos formando o teto, e que na segunda coluna da esquerda faltam três, (Confusa) demorei um mês para fazer esse cálculo porque a luz aqui é fraca e nem sempre vejo com nitidez. Tive a companhia de muita gente, raramente fico sozinha no quarto, não me lembro o nome de todos, a memória está falha, minha cabeça dói... (Suspiro - Ofegante)
Existem aqueles que não gostam de conversar.
(Pausa)
O silêncio me incomoda! (Irritada)
... Tento puxar assunto, mas não sou correspondida, é estranho porque parece que são impedidos de falar. Ao contrário destes, tinha um que gritava sem parar (Aumenta o tom de voz), ele pedia socorro, chamava por Deus, pedia perdão, e ninguém aparecia para ajudar. (Abaixa o tom de voz) Isso me incomodou muito. Era tão alto, eu não entendia... Será que só eu estava irritada com os berros daquele moço?(Olhar vago - Confusa)
Ele olhava bem dentro dos meus olhos, e eu podia ler seus lábios mesmo não se mexendo, queria que o ajudasse, mas como?
... Com as mãos e as pernas amarradas, eu não podia (Angústia - Medo)
(Pausa - Som - Trilha)
...Eu sonho sempre que estou do lado de fora daqui, chego a sentir meus pés tocando o chão (Feliz - Deslumbre - Prazer de momento)
(Pausa - Silêncio)
Eu não sabia como era lá fora até conhecer Tomás, é meu melhor amigo, está no quarto ao lado do meu. (Fala firme - com convicção)
... Ele tem tristeza no olhar, mais quando vem me visitar conversamos muito... Me conforta.
Um dia, entrou aqui no quarto fechou a porta e foi correndo em direção a janela, empurrou a cortina e me contou como era lá fora: (Exaltada - Fascinação)
“Disse que tinha um lago com uma cascata no meio, muitas flores, pássaros, as pessoas ficavam sentadas nos bancos lendo, conversando. Árvores, muitas delas... Ar puro... Ele me descreveu a paz..”
(Mantém exaltação - seguindo Pausa/Tristeza/Confusão)
Até que alguém abriu a porta e eu nunca mais vi Tomás...
"O silêncio do quarto é interrompido pela porta abrindo"
- Veio trazer meu jantar?
- Já disse pra não falar comigo. (Seco - Preparando injeção)
- Preciso conversar com alguém, já faz tão tempo que ninguém entra nesse quarto. (Calma)
- Ninguém jamais entrou nesse quarto. Além de mim. (Olhar fixo)
(Pausa - Silêncio/Trilha)
- O que aconteceu com Tomás? (Desconversa)
- Tomás? (Assustado)
- É... O paciente do quarto do ao lado, que sempre vinha me visitar, depois daquele dia que você pegou ele aqui na janela, eu nunca mais o vi...
Estava me contando como é lá fora... Você podia abrir a cortina um pouco, queria tanto poder ver as árvores... (Falar pausadamente)
- Quer que abra a cortina pra ver as árvores? Que árvores? (Ironia)
- As que o Tomás me descreveu.
"O enfermeiro vai até a janela e empurra a cortina".
- Ta vendo alguma árvore aqui? (Seco)
- Um muro branco. (Decepção)
- É isso mesmo. Um muro, cadeado e uma grade. Essa é sua realidade. (Agressivo - Aplica injeção)
(Pausa - Dor/Gemido/Grito)
- O Tomás mentiu pra mim.
- Para de falar nesse Tomás. (Segurando seu rosto)
- Ele é meu amigo.
- Esse cara era um psicopata. Um maluco. O pior paciente que já existiu aqui... (Exaltado)
Um infeliz, que ainda por cima era cego... Não aguentou a vida fria do manicômio, morreu amarrado nessa cama, neste quarto... Há mais 15 anos.

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